Olá, pessoal!
Hoje, faremos a primeira
parte de nossa viagem rumo a Bioquímica aplicada na cultura indígena. Vamos
juntos!
A princípio, caro leitor,
você pode se questionar se realmente uma coisa (a bioquímica) tem mesmo a ver
com outra (os índios). Essa reflexão é comum quando não paramos para pensar bem
nas possíveis associações entre dois campos que, aparentemente, à primeira
vista, tem pouca ou nenhuma relação. Mas é bem aí que está o engano! Ora, a
Bioquímica é a ciência que fala da vida sob uma lógica molecular, sem
distinções: onde há vida, há bioquímica, não é? Então, ao falarmos de gente,
por mais que nós não percebamos de forma imediata, estamos falando de seres
cuja base para a manutenção das funções vitais depende de relações entre moléculas
diversas, que formam determinadas substâncias, que apresentam funções
especiais, como armazenamento de energia, transporte de informações, formação
de estruturas rígidas (ou não), apropriadas para cada aplicação...
Mas sim, falemos dos índios.
Os índios, assim como todas
as pessoas, apresentam uma variedade de processos bioquímicos que sustentam a
vida, e também aprenderam a extrair da natureza diversas substancias cuja
utilidade é bem definida. E isso é muito interessante: no caso do Brasil, por
exemplo, no ano de 1500, marco histórico da chegada dos Portugueses ao nosso
território, os indígenas já tinham relativo controle sobre o meio ambiente,
numa relação respeitosa e sustentável. Esse domínio inclui também o
conhecimento, por exemplo, de propriedades de plantas como Pau Brasil,
Seringueira, Andiroba, Ayahuasca, Bubiri, Copaíba, Crotão, Cumaniol, Jaborandi,
Jararaca, Jenipapo, Quebra-pedra, Sapo-tricolor e Jararaca-ilhoa, http://www.jardimdeflores.com.br/ecologia/a35curare.htm
E essas propriedades foram
fundamentais ao permitirem a continuidade do legado dos povos tradicionais, com
a manutenção de sua vida e cultura, mesmo que a maioria dos índios não conheça
a Ciência como nós, acadêmicos, em 2015, conhecemos.
Assim, esse blog é também
uma homenagem àqueles que são parte essencial na formação de uma identidade
brasileira.
Seguindo, dentre essas
matérias primas vegetais citadas logo acima, hoje nós vamos falar de uma
bastante útil para os povos indígenas: o Curare.
A medicina moderna não seria
a mesma sem o curare. Veneno de flechas usado pelos índios da Amazônia, para
paralisar a caça ou matar seus inimigos, a tubocurarina, substância ativa do
curare, e atualmente seus derivados, fazem parte dos principais anestésicos em
uso clínico produzidos pelas empresas farmacêuticas multinacionais.
http://www.comciencia.br/reportagens/amazonia/amaz22.htm
![]() |
http://disciplinas.stoa.usp.br/pluginfile.php/219428/mod_resource/content/1/Alcaloides-AGO2014.pdf |
A tubocurarina é uma
substancia alcaloide, nitrogenada, de origem vegetal, que possui ação
farmacológica. A maioria das substancias desse tipo possui caráter alcalino, e
é encontrada nas angiospermas. http://disciplinas.stoa.usp.br/pluginfile.php/219428/mod_resource/content/1/Alcaloides-AGO2014.pdf
O curare normalmente é
preparado a partir de folhas do gênero Strychnos, que contêm alcaloides que
inibem as placas neuromotoras dos músculos estriados esqueléticos e são
encontradas nas florestas tropicais da América do sul.
Essa inibição ocorre nos
receptores nicotínicos de acetilcolina, pois a curarina e a tubocurarina, se
ligam a esses receptores, competindo com a ACh, mas sem o efeito de abrir
canais iônicos que esse neurotransmissor causaria. Assim, os impulsos nervosos
não são transmitidos por não haver entrada de íons Na⁺ na célula muscular, fazendo
com que não haja despolarização da membrana pós-sináptica, necessária para a
contração. Desse modo, os músculos ficam paralisados, inclusive os que atuam na
respiração, o que leva à morte por asfixia. A morte pode ser evitada por meio
da realização de respiração artificial na vítima. Para que haja essa paralisia,
o veneno precisa entrar diretamente na corrente sanguínea. Isso permite que
seja usado para caça, pois a ingestão da carne do animal afetado pelo curare
não causa envenenamento. http://neuromed95.blogspot.com.br/2012_05_01_archive.html
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Então, essa foi a nossa
primeira publicação. Falamos um pouquinho da bioquímica na vida e cultura
indígena, aplicada especialmente nos venenos de flechas, super necessários para
indivíduos e tribos caçadoras (e coletoras, mas essa é uma outra história).
E ai, gostou? O que achou?
Curioso? Interessante? Conta pra gente!
Interessante, com certeza!
ResponderExcluirMesmo sem conhecer o mecanismo bioquímico por trás do veneno, a necessidade de caça levou os índios a aprimorarem suas técnicas com uso desse veneno. O mesmo princípio deve aplicar-se aos remédios naturais, que foram motivo para biopirataria na amazônica por tantas indústrias farmacêuticas.
Nosso conhecimento científico moderno permitiu a produção de antídoto para esse veneno: a anti-colinesterase, que age como um inibidor da acetilcolinesterase (enzima que degrada a acetilcolina). Dessa forma, a acetilcolina permanece mais tempo nos receptores neuromusculares não ocupados pelo veneno.
Olá pessoal, tudo beleza? Muito legal a temática do blog e a postagem de vocês. Os mecanismos do curare e seu uso pelos índios. Nesse meu comentário vou pedir licença ao Humberto Gessinger e falar de "armas químicas e poemas". Enquanto o projeto Manhattan gastou bilhões para fazer armas químicas e biológicas, o curare tem sido usado há séculos, muito mais para caça e sobrevivência do que para guerra e poder, como a galera do Manhattan hehehe. Afinal, de pouco serviria o curare frente às armas dos fazendeiros - uma triste verdade.
ResponderExcluirVoltando à bioquímica, o curare é fenomenal! Podem dizer que é uma arma biológica, ou tentar comprar com o sarin, mas ainda sim ele é fenomenal! O mecanismo de ação é muito interessante e um de seus derivados pode ser usado como anestésico geral em cirurgias (Intocostrim).
Agora, os poemas! Não, melhor não. Acho que não cabe poemas na bioquímica. Piadas cabem :)! See U!
referências
ExcluirGRIFFITH, Harold. ENID, G. JOHNSON, M. D. "The Use of Curare in General Anesthesia." Disponível em: http://journals.lww.com/surveyanesthesiology/Abstract/1985/12000/The_Use_of_Curare_in_General_Anesthesia.41.aspx
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirSuper bacana a temática de vocês! Só para acrescentar, o curare é usado mais para proteger a vida do que acabar com ela, olhem em que situações crônicas ele pode ajudar: traumas musculares ou espasmos, artrite aguda, poliomielite e em pacientes que necessitam ser imobilizados durante uma cirurgia muito delicada, como a de catarata, ou em pacientes que precisam ser mantidos vivos em máquinas, permitindo ao anestesista controlar a respiração. Lógico que todos os casos são tratados com dosagem super controlada, não dá pra sair receitando curare pra qualquer um devido a seus efeitos colaterais. Estudos falam de morte em 6 minutos por asfixia dependendo da quantidade ingerida!
ResponderExcluirAh, mas os povos indígenas não o utilizam apenas para a caça, também usam o curare como anti-séptico, diurético, antifebril, e até como tônico. Vale ser o tema de uma postagem futura enfatizando esse outro lado (;
Na indústria farmacêutica, ele é usado em larga escala desde 1942, quando foi patentado pelos EUA, não havendo repartição de benefícios pelo acesso e uso desse conhecimento tradicional associado à biodiversidade, sendo caracterizado como mais um caso de biopirataria </3
Bom, fico no aguardo das novas postagens! ;)
GRUPO A
ResponderExcluirO curare pode ser obtido do suco de cipós de várias Strichnaceae, com S. toxifera, S schomburghii, S. castelnaea, S. Cogens, S. uraniana. É uma substância resinosa, negra ou vermelho escura que, quando reduzida a pó, apresenta-se de cor pardacenta e sabor amargo; é solúvel na água e nos humores, preciptável pelo éter e terebentina, termoresistente. Seu princípio ativo, a curarina, é uma substância córnea, higroscópica e solúvel.
É válido lembrar que algumas espécies do gênero Strychnos, de onde se extrai o curare, têm importância comercial, sendo que a mais conhecida é significativamente empregada na homeopatia. Embora várias espécies. Embora muitas espécies sejam tóxicas, muitas vêm sendo utilizadas popularmente para diversas afecções. A maioria das espécies usadas popularmente emprega o chá das folhas ou cascas. Angenot et AL, 1990b; Frederich et AL.,2000). Com as subsequentes ações farmacológicas: estimulante e tônica (S. acuta, S. brasiliensis, S. guianensis, S.pseudoquina, S. rubiginosa e S. trinervis), contra problemas estomacais e abdominais ( S. erichsonii, S.pseudoquina, S. trinervis), antipirética, analgésica e antireumática, no tratamento de doenças venéreas ( S. erichsonii), como abortiva, afrodisíaca e no tratamento da anemia (S. guianensis).
SILVA, M. A. et AL. Strychnos L. da América do Sul e Central. Ver. Brás. Farmacogn., João Pessoa, v. 15, n.3. Sept. 2005.
GRUPO F
ResponderExcluirPostagem interessante com certeza!
O curare sem duvidas é um produto muito importante na vida dos índios pois, como dito, há tempos é usado em suas caçadas. Mas como toda substância, ou pelo menos a maioria, seu beneficio ou maleficio está contido na dose, se uma dose controlada e bem manejada for administrada em uma pessoa pode atuar ajudando por exemplo em cirurgias onde o paciente deve ficar o mais imóvel possível ou ainda ajudando a evitar espasmos e convulsões na mesa de cirurgia, contudo este é apenas um dos vários usos farmacológicos do curare. Ele também é usado no tratamento de poliomelite e artrite. Enfim pode-se perceber que o uso farmacológico do curare é imenso e a escolha do tema e sua relação com os índios foi bem explorado, parabéns!
REFERÊNCIAS
http://www.botgard.ucla.edu/html/botanytextbooks/economicbotany/Curare/
Usar venenos nas pontas de suas flechas ou dardos, para paralisar a presa, ideia essa que, provavelmente, surgiu ao observarem que as cobras possuem um veneno capaz de paralisar suas presas. Hoje em dia, sabe-se que as α-toxinas do veneno da cobra se ligam ao sítio fixador de acetilcolina, neurotransmissor responsável pelas junções neuromusculares. Assim, essa toxina compete com a acetilcolina por esse receptor e isso debilita a função muscular. Esse déficit é, certamente, fatal caso músculos da respiração, por exemplo, sejam afetados. As pontas dessas flechas são embebidas em substâncias que agem analogamente ao veneno da cobra, ou seja, competem pelos receptores de acetilcolina.
ResponderExcluirBERNE, R. M.; LEVY M.N. Fisiologia, 4ª. ed., Ed. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 2000.
GRUPO K
ExcluirGrupo D
ResponderExcluirEm postagens como essas podemos observar o quanto à bioquímica está presente no dia a dia das mais diversas populações, seja de forma premeditada ou não.
Foi falado um pouco sobre o Curare que foi a primeira substância em que se observou a ação de bloqueador neuromuscular, que são drogas que interagem com os receptores da acetilcolina na face pós-juncional das placas motoras finais dos músculos estriados causado o bloquei da transmissão.
O curare é um composto orgânico do grupo do alcaloide que exerce ação relaxante sobre a musculatura. É uma droga paralisante usada em pequenas doses para relaxamento muscular, e derivada de várias plantas alcaloides da família Loganiaceae ou Loganlácea do gênero Strychnos.
É um potente inibidor, relaxante sobre o músculo estriado que atua como competidor da acetilcolina pela ligação aos receptores nicotínicos da placa motora. Assim, ao bloquear os receptores de acetilcolina, esses receptores, os quais são ionotrópicos para cátions, não se abrem. Desse modo, não ocorre o influxo de Sódio desencadeado pela atividade normal da placa motora, o que provocaria a despolarização da membrana pós-sináptica.
A introdução dos bloqueadores neuromusculares revolucionou a prática na medicina, ocorrendo uma redefinição na anestesia sendo frequentemente empregados para facilitar a ventilação mecânica e outras intervenções terapêuticas em adultos e crianças.
REFERÊNCIA
http://www.paulomargotto.com.br/documentos/Microsoft%20Word%20-%20BIP-2007.pdf
GRUPO I
ResponderExcluirMuito interessante a postagem que mostra um pouco da imensa cultura indígena. Cultura essa que faz parte também da nossa história como povo brasileiro, afinal qual seria o maior representante desse Brasil se não os índios. Além disso gostaria de agregar o fato de o antídoto usado contra esse veneno é, principalmente, um inibidor de acetilcolinesterase (anti-colinesterase), um fármaco que bloqueia a ação da enzima acetilcolinesterase, enzima que degrada a acetilcolina. Bloqueando essa degradação, mais neurotransmissores ficam disponíveis nas junções neuromusculares e atuarão numa taxa maior naqueles receptores não bloqueados pela toxina.
http://www.bedeteca.com/index.php?pageID=recortes&recortesID=1097http://www.jardimdeflores.com.br/ECOLOGIA/A35curare.htm
Como já foi dito, o curare era (não sei se ainda é uma prática usual) bastante utilizado para capturar animais. Os animais feridos pelas flechas se imobilizam rapidamente, sendo que os primeiros músculos que sofrem paralisia são os do pescoço, da nuca e, depois, dos membros. O diafragma demora a se paralisar, mas depois de um certo tempo o animal morre por asfixia. Detalhe: o animal pode ser consumido sem problemas porque o curare praticamente não é absorvido pela via digestiva. :)
ResponderExcluirPorque pode ser consumido sem problema a carne do animal que está com veneno,o que interfere o ser humano não ser infectado?
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